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Mulheres destacam-se na produção de comida

06/11/2015 09:50
Mulheres destacam-se na produção de comida

Moçambique possui 35 milhões de hectares de terra arável, dos quais somente 15 por cento estão a ser trabalhados para produzir comida e combater a insegurança alimentar, que continua a afectar um número considerável de moçambicanos.

São homens e mulheres de todas as províncias, distritos, postos administrativos, localidades, etc., do país, que não poupam esforços para produzir cereais, hortícolas, tubérculos e até gado bovino, caprino e outro. Tudo isso é feito na perspectiva de ver Moçambique a crescer e a vencer a batalha contra a fome e pobreza.

Foi assim na campanha agrícola 2014/15: pequenos e grandes produtores arregaçaram as mangas e puseram-se a trabalhar a terra, produzindo comida para alimentar não só as suas famílias como também outros concidadãos. Deste grupo de produtores, destacaram-se mulheres de vários cantos do país.

Como resultado desse esforço, elas foram homenageadas no lançamento da campanha agrícola 2015/2016, numa cerimónia realizada semana finda, na localidade de Bandeze, distrito do Lago, na província do Niassa. Foi o Presidente da República que colocou as faixas no ombro de cada uma delas, com dizeres sobre onde se destacaram. Trata-se do “Prémio Melhor Produtor Agrícola”, ganho por uma agremiação de mulheres de Pebane, na Zambézia, designada “Associação 7 de Abril”, que se dedica à produção agrícola na região. O “Prémio Melhor Investigador” também foi arrecadado por uma mulher, a investigadora Aida Cala, da província de Maputo. O “Prémio Melhor extensionista” foi atribuído a uma mulher, Ester Onesmo, do distrito de Chibuto, província de Gaza. O “Prémio Melhor produtora, mulher”, como é óbvio, foi para uma mulher – Avelina Sumbane, produtora do distrito de Boane, província de Maputo. Os prémios “Melhor Reportagem televisiva” e “Melhor Reportagem escrita” também foram atribuídos a duas jornalistas, uma da Televisão de Moçambique e outra do nosso Jornal.

É verdade que também houve prémios que foram atribuídos aos produtores do sexo masculino, em reconhecimento do seu desempenho na actividade agrícola, tais como o “Melhor agricultor jovem”, o segundo e terceiro “Melhores extensionistas”, o segundo e terceiro “Melhores produtores” e a melhor reportagem radiofónica, conquistado por um jornalista da Rádio Moçambique, Amílcar Cassamo, da delegação da Beira. Porém, o maior mérito na campanha agrícola 2014/2015 vai para a mulher que tudo fez quer para produzir comida, quer para fazer a investigação ou mesmo para recolher, tratar e divulgar a informação ao público, sobre a agricultura no nosso país, através de vários órgãos de Comunicação Social.

Associação de Pebane: melhor produtora do país

Criada em 2006, com 27 membros, sendo 25 mulheres e dois homens, a Associação das Mulheres 7 de Abril de Pebane, na Zambézia, é presidida por Felia Amade, camponesa que na sexta-feira (30) foi à tribuna montada no distrito de Lago, no Niassa, para receber, das mãos do Chefe do Estado, Filipe Jacinto Nyusi, a faixa com dizeres de “Melhor produtor agrícola, nacional, na campanha 2014/2015”.

“É uma grande alegria para mim e para todos os membros da nossa associação. Nunca esperei receber algo do Presidente da República. É um estímulo para trabalharmos cada vez mais e melhor, sobretudo porque recebemos um tractor que nos vai ajudar a lavrar mais áreas e aumentar a produção e a produtividade das nossas machambas. Estou muito contente”, disse Felia Amade, acrescentando que é um ensinamento para as pessoas que não gostam de trabalhar, pois aqueles que fazem algo têm sempre resultado, ainda que demore, mas sempre chega às nossas mãos. “O importante é trabalhar”, sentenciou.

Ela explicou que quando iniciaram a actividade eram muitos, mas as pessoas que não gostam de trabalhar e que querem resultados imediatos foram abandonando a associação e neste momento ficaram apenas 15 membros, sendo 13 mulheres e dois homens.

“As pessoas não gostam de trabalhar, só querem benefícios, mas os resultados do trabalho da machamba levam tempo, por isso é preciso paciência e trabalho duro”, explicou Felia Amade.

A associação explora 5 hectares, sendo que em dois produz hortícolas e em três produz milho, amendoim e mandioca. Agora projectam aumentar áreas de produção.

Os resultados da produção são colocados no mercado, sendo que uma parte do valor obtido é colocada na caixa de poupança da associação e o resto distribuído pelos membros, para a satisfação das necessidades individuais.

Segundo Felia Amade, a agremiação desenvolve também um trabalho social, que consiste em apoiar doentes internados no hospital de Pebane, crianças órfãs e mulheres viúvas. Assim, uma ou duas vezes ao ano (dependendo dos resultados da produção), a associação oferece produtos alimentares ao hospital e ao infantário local. Também disponibiliza um valor monetário às crianças órfãs para a aquisição de material escolar.

Quanto às mulheres viúvas, segundo explicou, a Associação 7 de Abril ajuda-as a começar alguma actividade rentável, dando-lhes, para isso, um valor monetário. Segundo as suas palavras, 32 mulheres locais já beneficiaram desta actividade de carácter social da agremiação.

Falando concretamente da produção, Felia Amade, acompanhada da sua colega da associação, Julieta Vitereno, disse que se não fosse a falta de chuva os resultados da produção seriam maiores, tendo em conta que a vontade de trabalhar bem e melhor existe no seio dos membros do grupo. Nesta época que termina, a associação conseguiu juntar 145 sacos de milho, apenas para dar um exemplo daquilo que é possível obter no seu trabalho. “Trabalho existe, só que quando a chuva cai pouco, o resultado também é baixo”, lamentou-se.

UM IMPULSO PARA TRABALHAR BEM

Avelina Sumbane, à semelhança de outros produtores, e não só, foi homenageada no lançamento da campanha agrícola 2015/16 como “Melhor Produtora Mulher”, em reconhecimento do trabalho que desenvolveu em 2014/15, na sua machamba, no distrito de Boane, província de Maputo.

Para ela, tal facto é um impulso para trabalhar bem e melhor. “Agora vou duplicar ou triplicar o meu trabalho, pois já tenho um instrumento para tal, que o considero uma bênção de Deus e que chegou na hora certa, no momento que era muito necessário”, disse.

A nossa Reportagem soube que a entrevistada ganhou um tractor com as respectivas alfaias e um atrelado, 10 cabeças de gado bovino e uma formação técnica, para além da viagem que lhe permitiu participar na cerimónia de lançamento da campanha. Ela disse que já trabalhava com um tractor, mas alugado.

Juntamente com a sua irmã, Avelina Sumbane explora uma área de 13,7 hectares, na localidade de Mabadja, em Boane, com ajuda de 24 trabalhadores, entre homens e mulheres. Produzem tomate, repolho, pepino, cenoura, alho, cebola, piripíri, couve, alface e milho, este último para a rotação das culturas, necessária para que a produção não baixe. Os produtos são vendidos a grossistas que se deslocam ao terreno para comprá-los e, mais tarde, colocá-los nos mercados da cidade de Maputo e Matola. As próprias produtoras vendem alguns produtos em Boane e no mercado grossista do Zimpeto. Para tal, servem-se de duas camionetas de quatro toneladas e duas de uma, cada, para o escoamento da produção.

Segundo Avelina Sumbane, não há produção que não seja colocada no mercado. Ela está nesta actividade desde 1998. Começou por explorar uma área pequena, em Mafuiane, numa associação. Mas o facto de haver corte constante de água, associado ao problema de energia, numa altura em que as culturas precisam, levou a que ela e a irmã procurassem uma outra zona.

Avelina Sumbane explicou que abraçou a actividade agrícola porque costumava comprar tomate e batata na África do Sul. “Há certo momento de muita procura de tomate e todas as pessoas vão à África do Sul. Quando chegávamos lá ficávamos numa fila enorme, mas por vezes nem conseguíamos o produto porque acabava e isso era desgastante. Assim optámos por apostar na produção local de tomate”, explicou.

CHIBUTO COM A MELHOR EXTENSIONISTA

EM Chaimite, distrito de Chibuto, província de Gaza, foi encontrada a melhor extensionista da época 2014/15. Chama-se Maria Ester Onesmo. O seu trabalho consiste em dar assistência aos produtores, na transferência das novas tecnologias de produção agrícola. O afinco e dedicação com que tem desenvolvido as suas actividades, percorrendo longas distâncias, por dia, debaixo de sol intenso, para cobrir maior número possível de produtores, lhe valeu reconhecimento.

Era obrigada a percorrer 30 quilómetros de motorizada, passando por vários campos agrícolas, agora a situação vai mudar. Do pacote de bens que compõem o prémio, consta uma viatura 4x4, cabine simples. Para ela, trata-se de um instrumento que lhe vai proporcionar melhores condições de trabalho.

Segundo explicou ao nosso Jornal, Ester Onesmo assiste a 902 agricultores. Não é fácil trabalhar com um grupo numeroso, mas tendo em conta que a maioria está em associações, ninguém fica sem assistência. “Organizo actividades em dias de campo, fazendo demonstrações de resultados”. Alguns adoptam as novas tecnologias, outros oferecem resistência, alegando que já vêm trabalhando há vários anos na agricultura sem tais técnicas, mesmo antes de eu nascer”, conta.

A interlocutora acrescentou que mesmo assim não desiste, usa várias formas de lidar e sensibilizar os produtores a trabalharem segundo as novas técnicas de produção.

“Quando eles vêem o resultado do campo de demonstrações ou de outros produtores que adoptaram as novas tecnologias, com mais milho ou outros produtos, acabam cedendo”, referiu, sublinhando que melhor do que falar é mostrar os resultados.

Ester Onesmo é extensionista desde 2013, depois que se formou na área em Chókwè, na mesma província, onde em 2006 fez o ensino básico e em 2010 o curso médio. Segundo ela, tem sido mais fácil para si trabalhar com homens que mulheres, pois apresentam vários argumentos.

APAIXONADA PELA INVESTIGAÇÃO

Aida Cristina Cala, veterinária, é uma mulher “apaixonada” pela investigação. Recebeu o “Prémio Melhor Investigador na Agricultura e Segurança Alimentar, 2014/2015, que consiste numa viatura 4x4, dupla cabine, uma participação numa conferência internacional sobre investigação, um computador (“laptop”) com internet, e outros artigos inerentes ao trabalho que desenvolve como investigadora.

Interpelada pelo nosso Jornal sobre o facto, ela disse que tal significa um sentimento de alegria e de gratidão. Primeiro, de gratidão a Deus por tudo quanto tem feito por si, e de alegria porque foi reconhecido um trabalho de uma equipa que já vem sendo realizado há bastante tempo.

“É uma mistura de satisfação, alegria e, sobretudo, de responsabilidade porque ganhar um prémio não é só receber e arrumá-lo. É uma grande responsabilidade, tendo em conta que temos de manter esta linha de investigação”, disse Aida Cala.

A nossa interlocutora é veterinária e trabalha na área de sanidade animal. No trabalho premiado testou, juntamente com a sua equipa, algumas drogas para ver a sua eficácia no controlo de parasitas gastrointestinais em ruminantes (bovinos, caprinos e ovinos).

Segundo ela, o resultado mostrou-se promissor. “É verdade que ainda há necessidade de muitos testes para se chegar a uma conclusão de que o resultado é positivo, pois isso não é feito de um dia para outro. Ainda precisamos de continuar a fazer muito mais testes. Porém, nesta primeira fase, o trabalho já indicou que é promissor”, explicou Aida Cala, acrescentando que o trabalho foi feito no distrito de Magude, província de Maputo.

Entretanto, a primeira fase da investigação, financiada pelo Ministério de Ciência e Tecnologia, Ensino Superior e Técnico-Profissional - Fundo Nacional de Investigação, que decorria desde 2012, já terminou. “Agora vamos voltar a elaborar este projecto, procurar novos financiamentos para dar continuidade ao trabalho, já na segunda fase”, afirmou.

Ela disse gostar do seu trabalho de investigação até ao ponto de tratar os parasitas por tu. “Eu e eles temos uma relação de convivência”. Para isso, percorre Moçambique sem medir esforços, visando desenvolver a actividade de investigação. E o carro de campo que ganhou vai-lhe levar para onde os factos acontecem, lá onde está o criador de gado: a zona rural.

DELFINA MUGABE